Alunas de Santo Augusto discutem participação feminina na política
A partir de conteúdos aprendidos em sala de aula e situações do cotidiano do campus, alunas dos cursos técnicos integrados ao Ensino Médio do Campus Santo Augusto motivaram a criação de um grupo de estudos que debate o empoderamento da mulher e a participação feminina na política.
Foto: intervenção realizada por professora e alunas do Campus Santo Augusto em 2016
Em 2016, um grupo de meninas do ensino médio vivenciava situações machistas no Campus Santo Augusto. Os colegas perguntavam: “por que mulher quer direitos se não aguenta carregar nem um saco de adubo?”. A resposta veio na forma de uma intervenção: um carrinho de mão com um saco de adubo em cima foi colocado em um espaço do campus.
Com o auxílio da professora de geografia, Cláudia Alves dos Santos, as alunas construíram um espaço chamado Machismos Cotidianos. Neste espaço, foi colocada a pergunta feita pelos meninos e o carrinho de mão. “Tentamos demonstrar que no mundo de hoje a força física não é tão importante como ressaltam alguns grupos de alunos”, explica a professora Cláudia.
Numa das aulas da professora Cláudia dos Santos, a aluna Letícia Strossi, do Curso Técnico Integrado em Agropecuária, aprendeu que a emancipação feminina era responsável pela queda na taxa de fecundidade no Brasil. “Nesse momento, como uma grande curiosa, comecei a questionar sobre essa situação, nunca havia imaginado que nossa independência afetasse questões como essa”, relata Letícia.
Allana Trevisan, aluna de outra turma do Curso Técnico em Agropecuária, também se interessou por temáticas feministas nas aulas da professora Cláudia. “A professora Claudia conseguiu ver algo que nem eu mesma sabia em mim: ela foi a primeira pessoa a descobrir que eu era feminista sem nem mesmo saber o que era o feminismo”, conta Allana.
Projeto de Ensino pesquisa participação de mulheres na política
Percebendo o interesse das alunas, Cláudia dos Santos retomou o tema em outras aulas e em conversas fora da sala de aula. A partir daí, em 2016, Letícia, Alana, a professora Cláudia, e outras alunas e alunos criaram o Projeto de Ensino ‘A situação das mulheres na contemporaneidade: reflexões entre discentes e docentes no IF Farroupilha’.
Foto: grupo de estudantes promove debate sobre mulher na política, em 2018, no campus Santo Augusto. Da esquerda para a direita: llana Trevisan, Luan Motta, Letícia Strossi, a professora Cláudia Santos, Vitor Schmidt, e Victória Munlen
O projeto consistiu na formação de um grupo de estudos para ampliar as discussões sobre a situação das mulheres feitas em sala de aula. As estudantes sugeriam temas e a professora Cláudia, coordenadora do Projeto, indicava textos e documentários. O grupo também realizava apresentações e intervenções no campus.
O grupo realizou apresentações em eventos como o XVIII Encontro Nacional de Geógrafos, em São Luís, no Maranhão, em 2016, e o Fazendo Gênero 11 e 13º Mundos de Mulheres, em Florianópolis, em 2017. O grupo também foi premiado como trabalho destaque na Mostra Técnica do Campus Santo Augusto no ano passado.
O projeto de ensino realizado em 2017 ‘Pesquisando e refletindo sobre as mulheres na política brasileira: um enfoque à região noroeste do RS’, teve origem no de 2016. O objetivo do projeto era propor a conscientização e a participação dos estudantes no processo político brasileiro através de pesquisas e análises sobre a atuação de mulheres na política em municípios da região noroeste do Rio Grande do Sul.
Além das discussões em grupo, este projeto também previa entrevistas com vereadoras da região e o estudo de dados específicos envolvendo a participação das mulheres na política. De acordo com Claudia dos Santos, poucas destas vereadoras se dispuseram a responder. De todas as entrevistadas, nenhuma tinha projetos específicos para mulheres.
“É importante destacar que foi um universo pequeno de entrevistadas, mas como essas adolescentes vivem nesses municípios, acabaram conhecendo a realidade dessas mulheres na política”, conta a professora Claudia. Apesar da representatividade destas mulheres políticas da região ser um dado importante, um dos grandes ganhos do projeto foi o crescimento da consciência política dos alunos envolvidos.
A estudante Letícia Strossi, que participou dos dois projetos, disse que a ideia criada pelo senso comum de que política é suja foi rompida em seu imaginário. “É impossível ver nossa pouca representatividade na política e não mudar”, disse Letícia, que também contou que pretende “ocupar os espaços políticos e continuar na luta por uma sociedade mais justa”.
Allana Trevisan também teve sua percepção alterada pela participação nos projetos. “O grupo mudou a minha vida e principalmente mudou meu estilo de vida, fazer parte de um projeto como esse faz com que tenhamos a oportunidade de ver e mudar nosso cotidiano”. Allana também contou que entender as situações de desigualdade e a importância da política faz com que se deixe de “acreditar e reproduzir discursos fáceis que estão presentes no cotidiano”.
Machismo no campus é reflexo de construções culturais
Não são apenas os alunos que participam dos projetos da professora Claudia dos Santos que são impactados pelas discussões e ações do grupo no Campus Santo Augusto. A professora conta que hoje existem estudantes que não fazem parte do projeto, mas buscam participar das atividades relacionadas às discussões de gênero.
Foto: estudantes do campus Santo Augusto fizeram um desfile sobre 'mulheres polêmicas' no Campus Santo Augusto, no dia 8 de março de 2018
“No ano passado, tivemos um número significativo de estudantes para estruturar o He for She no campus”, exemplifica a professora. “No final do ano, uma estudante chamada Vanessa Moura teve a ideia de colocar frases nos banheiros da escola para proporcionar o empoderamento feminino”.
Mesmo assim, a temática enfrenta certa resistência de alguns grupos. A professora Claudia dos Santos conta que no Campus Santo Augusto, nos últimos dois anos, ficou nítida uma certa resistência dos meninos ao processo de apropriação das discussões relacionadas ao feminismo.
Esta situação, porém, está longe de ser um caso isolado. “A resistência que existe no IF Farroupilha, na verdade, é um reflexo do que eu chamo de construções culturais existentes aqui no Rio Grande do Sul”, avalia Claudia. “O nosso IF não é deslocado das construções geográficas e culturais, portanto esse imaginário do ‘gaúcho macho’ não é facilmente quebrado”.
Claudia já morou em outras grandes cidades do país, como São Paulo e Salvador. Mas foi aqui que ela se percebeu mais feminista. “A afirmação ‘eu sou feminista’ é uma resistência aos machismos cotidianos que vivencio”, relata a professora.
“Não podemos trabalhar com a ideia de que todas e todos serão feministas, o que tentamos com o grupo, durante os dois anos, foi o reconhecimento da luta das mulheres”, analisa a professora Claudia dos Santos. Para ela, a luta por uma empatia entre as minorias é diária.
Dia Internacional da Mulher - O Dia Internacional da Mulher é comemorado no dia 8 de março. As unidades do IF Farroupilha organizam diversas atividades para comemorar a data que lembra a luta das mulheres pela igualdade de direitos. Acompanhe nosso site para saber mais sobre as atividades nos campi.
O projeto ‘Pesquisando e refletindo sobre as mulheres na política brasileira’ recebeu recursos do edital de concessão de apoio financeiro a Projetos de Ensino do IFFar e teve a participação dos seguintes estudantes: Allana Trevisan e Vitor Erseno Schmidt, do 2º ano Curso Técnico Integrado em Agropecuária, Letícia Strossi, do 3º ano do Técnico Integrado em Agropecuária, Luan Felipe dos Santos Motta, do Técnico Integrado em Administração e Victória Poliana Von Munhler do 2º ano do Técnico Integrado em Alimentos.
Galeria de fotos: painéis produzidos por alunos do campus Santo Augusto sobre 'mulheres polêmicas' nas diversas áreas do conhecimento, como artes, literatura e música. O trabalho contou com o apoio dos professores Edevandro Sabino, Miquela Piaia, Soní Pacheco, João Massoti, Teoura Benneti e Sthefany Dias.
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